Tentar escrever quando se está sufocado é uma tarefa difícil, não é difícil só porque procurar pelas palavras exige muita paciência, mas porque as próprias palavras se fundiram dentro da impaciência e do pânico do cotidiano. O tempo passando deixa um rastro de incompletude e um vazio nos gestos, porque carrega medo de morte e pressa de vida. E como encontrar o próprio gesto que corresponda à uma vida toda? Ou melhor, como encontrar a palavra-gesto que corresponda à uma vida toda de quem ouve? Não existe, talvez? Tentar descrever isso é tão bizarro quanto existir nesse rio que não para. Entendendo meu próprio sopro nesse movimento é que doeu tudo, porque me ver responsável pelas minhas próprias palavras diante de quem espera tanto por elas mudou todo o curso da minha vida, porque antes eu dizia era para mim, agora tenho que dizer é para eles. Como será que eles ouvem? Será que ouvem esse ruído gasto que muito provavelmente eles estão muito próximos de encontrar na própria vida ruída e já muito gasta? Como encontrar a vida de novo? Como reinventar a vida com as mesmas palavras, os mesmos conceitos? Serão necessários outros conceitos? Como cria-los? O fluxo é que talvez poderia dizer, no seu devir infinito, mas ele mesmo não diz, ele mesmo não pensa a si mesmo, a vida não pensa a si mesma, quem pensa é o homem, já afogado no rio.
Como desafogar então este homem, colocá-lo para respirar, mostrar de novo a ele a vida que continua tão vida como sempre foi?